6.10.05

Penso: “o meu povo”.
Uma miragem de água barra-me o caminho: um lago salgado, de águas absolutamente paradas. Mergulho nele, flutuo sem fazer um gesto.
Quando regresso à margem, estou seco. Torno a olhar o lago: a água não se agitou nem um pouco que fosse. Chamo então o vento suave, e ele vem. Mas continua inpassível, o rosto do lago. Chamo, pois, o vento de tempestade. Em vão: ele ruge, assobia, sopra, mas tudo permanece igual, à superfície.
Mando o vento embora e vejo-me reflectido na água, misturado com o sol, por trás e por cima da minha cabeça. Mas o brilho da luz altera as formas, e quase não me reconheço: pareço um deus sem pátria — um deus caído em desgraça. Pergunto, em voz bem alta: “qual é o meu povo?”
A miragem desaparece, e oiço uma risada longínqua, que me estremece o peito. Envenenado, ainda. Será que tenho de sangrar todo, será que tenho de morrer para me libertar disto? Ou será que estou a enlouquecer — ironia última — com algo que não existe?

Sem comentários: